A música é uma forte aliada do Marketing e costuma ser utilizada nas mais diversas formas, desde métodos mais sutis até maneiras mais escancaradas.
Um simples refrão pode fazer o trabalho. Basta lembrar dos jingles: canções curtas de fácil memorização com uma mensagem publicitária incorporada para promover uma empresa, produto ou candidato político.
(Bem difícil ler isso sem cantarolar, não é mesmo?)
Isso também pode ser trabalhado como um gatilho inconsciente. Sabe as músicas que costumam tocar enquanto você faz suas compras no supermercado?
No excelente livro Contágio, o autor Jonah Berger conta alguns testes feitos para avaliar o comportamento de compra das pessoas no setor de vinhos.
Em alguns dias, tocavam canções francesas que imaginaríamos ouvir em um café parisiense às margens do Rio Sena. Em outros, uma trilha sonora digna do Oktoberfest alemão.
O que observaram foi que, com músicas francesas, a maioria dos consumidores escolhia vinhos franceses. E com músicas alemãs, vinhos alemães.
Existem ainda situações menos sutis que essa, porém, menos escancaradas que os jingles — quando a música se torna a principal estratégia de divulgação do conteúdo, embora seja apenas parte de sua trilha sonora.
Quem veio primeiro: Frozen ou Let it Go?
Quando lançado em 2014, o filme Frozen não se tornou um hit logo de cara. Primeiro, a canção “Let it go” conquistou sua fama e, depois, o filme.
Numa excelente estratégia de Marketing, a Disney deixou disponível um vídeo em versão karaokê sing-along (para cantar junto) — que hoje totaliza mais de 1,7 bilhão de visualizações.
Falando bem ou mal, todos comentavam sobre a música nas redes sociais e no dia a dia. Por mais que você não tenha publicado algo, é bem provável que tenha opinado sobre a canção no seu cotidiano.
Sabe aquele clichê “fale bem ou fale mal, mas fale de mim”?
Neste caso, ele se encaixa perfeitamente. Com tantos comentários, a música se tornou um hit e, por fim, o filme também — pegando carona no sucesso de “Let it go”.
Ainda hoje, a canção é lembrada e reinterpretada por muitas pessoas, enquanto o filme acabou se tornando basicamente um clipe em versão estendida.
E na quinta temporada de Black Mirror, a Netflix apostou em uma estratégia bem similar e ainda mais elaborada.
Black Mirror e a aposta em Miley Cyrus
Marketing de influência, certo?
Sim, a Netflix despertou o interesse da legião de fãs da Miley Cyrus ao utilizá-la no elenco.
Até então, nada de inovador. Essa estratégia já foi utilizada inúmeras vezes e, claro, existem exemplos que tomaram maiores proporções — como a ação da Pepsi com Michael Jackson, que contou com uma releitura de Billie Jean.
A estratégia da Netflix ganha uma camada extra ao escalar Miley Cyrus para interpretar uma cantora pop em crise com a própria carreira. Dessa forma, a trama desperta a curiosidade e a empatia até mesmo de quem não aprecia suas músicas.
E se torna ainda mais ousada com o lançamento de músicas e videoclipe de Ashley O — a personagem fictícia de Cyrus. O que incluiu ainda um perfil para a artista no Spotify:
Foi no momento em que vi uma notícia sobre o lançamento do clipe que comecei a ficar curioso em relação ao episódio. Mas somente depois de escutar a música, é que fiquei com vontade de ver a participação de Miley Cyrus em Black Mirror.
— Por quê? Você gostou tanto assim da música?
Não necessariamente.
Referência à banda Nine Inch Nails
Um importante detalhe é que o principal hit de Ashley O — “On a Roll” — é uma releitura em versão pop de “Head like a Hole”, da banda americana Nine Inch Nails, que tive a felicidade de ver ao vivo no Lollapalooza 2014.
Somente após notar esse fato, decidi ver o trailer do episódio e, após ficar ainda mais curioso, resolvi assisti-lo. E como fã da banda, não me decepcionei, pois são feitas várias referências sutis a ela por meio de easter eggs.
Com a enorme repercussão da 5ª série de Black Mirror, o Nine Inch Nails também se favoreceu: desde que o episódio foi lançado, as buscas pela banda no YouTube cresceram em 300%.
É possível que você não tenha gostado do episódio. Ou ainda não tenha visto.
Mas é certo que, em algum momento, você escutou um comentário sobre a participação da Miley Cyrus, viu uma notícia abordando as músicas lançadas ou mesmo algo sobre Nine Inch Nails.
Assim, com todas as camadas que a estratégia ganha, ela vai além do Marketing de Influência e se torna Buzz Marketing: quando você cria algo chamativo o bastante para apostar que as pessoas irão falar sobre isso e, então, deixa que o boca a boca faça o trabalho de divulgação por você.
Parabéns ao Charlie Brooker, criador de Black Mirror, e aos demais envolvidos por essa ação de marketing — que deu gosto de ver.