Desde que o confronto entre Brasil e Bélgica se desenhou, essa pauta vem se formando na minha cabeça. Na verdade, até antes disso, quando foi divulgado o texto de Romelu Lukaku.
Se você ainda não leu esse texto, pare tudo o que está fazendo e leia agora. Não tenho nada para te falar aqui que será mais impactante que o artigo do belga.
“Quando éramos crianças, não podíamos pagar para ver Thierry Henry no Match of the Day! Agora, estamos aprendendo com ele todos os dias na seleção (…) e ele está me dizendo tudo sobre como atacar os espaços como ele costumava fazer. (…) Isso é a coisa mais legal do mundo para mim. Eu apenas realmente, realmente gostaria que meu avô estivesse vivo para ver isso. Não estou falando da Premier League. Nem do Manchester United. Nem da Champions League. Nem da Copa do Mundo. Não é disso que estou falando. Eu apenas queria que ele estivesse vivo para ver a vida que temos agora. Eu gostaria de ter mais uma conversa com ele por telefone, para poder dizer para ele: ‘Viu? Eu disse para você. Sua filha está bem. Não há mais ratos no nosso apartamento. Ninguém mais dorme no chão. Não há mais estresse. Estamos bem agora.’ (Romelu Lukaku)”
Link para a versão original, em inglês.
Link para a versão em português.
Desde então, ficou mais intragável do que nunca assistir a cenas como essa:
Tenho enorme dificuldade de me identificar com o camisa 10 da seleção e, por isso, sou incapaz enxergá-lo como ídolo. Não consigo simpatizar com sua atuação (literalmente, atuação) nem dentro, nem fora de campo.
Ele é sempre teatral demais, tanto em suas quedas, quanto no choro e até ao lamentar a eliminação, quando declara ter dificuldades de reencontrar motivação para jogar. Como se o futebol para ele fosse um flagelo.
Para não prolongar muito a implicância com o Neymar, vou me ater a duas repercussões recentes. Primeiro, essa versão inusitada de “Aquarela do Brasil” cantada pelos belgas:
Depois, essa “homenagem” prestada por crianças ao brasileiro:
Se antes do Mundial, ele era visto como o mais provável sucessor de Messi e Cristiano Ronaldo, agora já vê o francês Kylian Mbappé, de 19 anos, passando à sua frente.
Além de ser mais novo e ter apresentado melhor desempenho que Neymar na Copa, o francês ainda vem dando o exemplo fora de campo:
Ele tem doado os 20 mil euros que recebe por partida, pela seleção francesa, para instituições de caridade. E não costuma dar entrevistas, pois acredita que outros colegas de seleção têm maior propriedade para falar, pois já vestem a camisa francesa há mais tempo.
(Somente fiquei sabendo sobre o comportamento de Mbappé fora de campo graças a essa publicação do Marc Tawil.)
Mas afinal, o comportamento do Neymar importa tanto assim?
Sim. Primeiro, pela imagem que ele promove do futebol brasileiro e do nosso país como um todo:
“Neymar é nosso maior craque, nossa principal referência em campo. E, em todas as fotos, veste a única camisa pentacampeã do mundo, a da Seleção Brasileira. A crise de imagem dele é também a nossa — jogadores, comissão e torcida. ( Marc Tawil)”
Eu não vejo ele como ídolo e você, muito provavelmente, também não. Mas, por outro lado, tem toda uma geração de jovens que sonha em jogar futebol e busca uma referência para se espelhar.
Se quiser um exemplo disso, basta lembrar da legião de crianças que cortou o cabelo estilo Cascão da Turma da Mônica, em 2002, inspiradas no Ronaldo Fenômeno.
E não são apenas jogadores de futebol que estão sujeitos a dar maus exemplos e influenciar novas gerações.
Influenciadores digitais
Nesse tópico específico, me refiro aos youtubers, como Felipe Neto, Whindersson Nunes e Júlio Cocielo.
Eu mesmo cheguei a acompanhar o trabalho dos dois primeiros, dei boas risadas com eles e vi, inclusive, como o Felipe Neto foi capaz de formar a opinião de milhões de pessoas sobre o filme Crepúsculo.
E quando falo milhões, não é hipérbole. Enquanto escrevo este artigo, o vídeo dele tem exatamente 15.802.049 visualizações.
Obviamente, cada um deles tem seu mérito por ter alcançado o sucesso e uma legião tão grande de seguidores. Mas todos eles carregam uma responsabilidade gigantesca, proporcional ao seu número de fãs. Lembra da célebre frase do Tio Ben?
Pois então, com o crescimento exponencial do YouTube e a tendência dele acabar substituindo a televisão, teremos gerações fortemente influenciadas por youtubers. Ou caso não tomemos os devidos cuidados, até mesmo educadas por eles.
No meu último artigo, mencionei como crescer nos anos 90, quando É o Tchan era considerado entretenimento adequado para crianças, me fez ter dificuldades para entender o feminismo.
Quais seriam os possíveis efeitos da geração que cresce assistindo ao YouTube?
Não faço ideia e só o tempo vai nos dizer, mas é isso que torna declarações como a do Cocielo ainda mais graves (além do racismo repudiável, é claro).
Quando enxergamos alguém como referência, ou mesmo como ídolo, pequenas atitudes podem nos causar um enorme impacto. E não só nos mais jovens.
Conforme crescemos, temos a tendência de passar a lidar com a idolatria de uma forma mais saudável e natural. Como se tirássemos nossos heróis do pedestal. Ou ao menos diminuíssemos um pouco a altura do pedestal.
Então, a intensidade da influência que sofremos acaba diminuindo com o tempo, mas não deixa de existir.
E é exatamente sobre os efeitos de minhas principais referências em mim que quero falar com você agora:
Na produção de conteúdo
Agora sim, vamos falar dos influenciadores do LinkedIn.
Em primeiro lugar, existe uma chance enorme de eu nem ter começado a escrever regularmente por aqui, se não fosse pelo Matheus de Souza, seu curso e seus artigos.
Além dele, a minha gestora — Luiza Drubscky — também teve papel fundamental para me incentivar a começar esse projeto.
Então, se você gostou de qualquer coisa que eu tenha escrito por aqui, já sabe a quem agradecer.
Recentemente, também recebi uma verdadeira lição de humildade conversando com o Marc Tawil:
Por ser editor do Comunidade Rock Content, estou numa posição privilegiada de ter um contato um pouquinho maior com nomes como Matheus de Souza, Murillo Leal, Laíze Damasceno e o próprio Marc.
Quando vemos seus textos, publicações e seguidores aqui, imaginamos que eles são pessoas quase inacessíveis, não é? Pelo menos essa era a visão que eu costumava ter. Mas a realidade é muito diferente.
Enquanto explicava sobre a parceria para o Marc via skype, comentei que nossa base não teria um alcance e um engajamento tão grande quanto o perfil dele no LinkedIn, por exemplo. E antes mesmo que eu seguisse para focar nos prós da parceria, ele disse o seguinte:
“Não tem importância. O que importa é o nome Rock Content.”
Foi uma frase tão curta e simples, mas que teve maior impacto que alguns trechos de livros de autoajuda que já li. Isso porque veio de alguém que enxergo como referência.
(Não digo isso como bajulação, pois antes dele se tornar nosso parceiro, já era um nome que eu acompanhava de perto para me inspirar. E, somente por isso, propusemos a parceria.)
E é o mesmo caso do exemplo do próximo tópico:
Na música
Em 2010, uma das minhas bandas preferidas veio ao Brasil pela primeira — e única — vez e ganhei dos meus pais, como presente por ter passado no vestibular, o ingresso e o direito de ir ao show.
Já ouviu falar em Social Distortion?
(Se três pessoas conhecerem, já vou achar muito hehe.)
Eles são uma banda de Punk Rock americana que foi amadurecendo com o tempo e ganhando tons de Rock’n Roll, inspirando-se bastante nos Rolling Stones, e chegando em um estilo diferenciado nos álbuns mais recentes, que eu chamaria de Punk’n Roll.
(Mas isso não é tão relevante para o texto. É apenas meu espírito de fã querendo falar da banda.)
Na época, cheguei a comemorar mais o show em si do que a aprovação no vestibular, para você entender o nível de idolatria envolvido.
Durante o show (e esse é o ponto crucial da história), durante uma pausa entre uma música e outra, o vocalista da banda tomou o cigarro de um fã na plateia que estava na primeira fila, apagou-o com um pisão e disse o seguinte:
Você ainda vai me agradecer por isso um dia.
Foram exatamente essas palavras. Há mais de oito anos e ainda lembro perfeitamente.
Agora, adivinha quem nunca mais cogitou colocar um cigarro na boca na vida?
Foi uma atitude extremamente simples, uma frase extremamente simples, mas um gesto que me impactou demais. Mais uma vez, por vir de alguém que enxergava, e passei a enxergar ainda mais, como ídolo.
Moral da história
Geralmente, não gosto de incluir tópicos explícitos de conclusão em meus textos. Porque sinto que eles digerem muito o conteúdo, a ponto de entregá-lo quase em formato de papinha para o leitor. E eu prefiro ler textos mais desafiadores e que me levem a pensar.
Mas nesse caso, achei necessário para ajudar a ligar os pontos de tudo o que falei aqui:
Não devemos exigir que pessoas públicas, ou com grande poder de influência, sejam modelos positivos para seus seguidores. Não temos esse direito.
O Neymar, por exemplo, carrega um fardo inimaginável de vestir a camisa 10 da seleção brasileira aos 26 anos. Ele é apenas um jogador de futebol e nunca quis ser referência para ninguém.
O direito que temos é o de escolher quem serão nossos ídolos e espelhos.
Conhece aquela máxima que diz que você é uma média das 5 pessoas que você mais convive? Ela também é válida para quem você segue, seja através da música, da produção de conteúdo ou de sua trajetória profissional.
Nesses casos, como te mostrei, frases curtas e pequenas atitudes podem ter grandes impactos — positivos ou negativos. Então, escolha bem.