Tem boas chances que você já conheça a Jornada do Herói, ou pelo menos tenha ouvido falar nela — especialmente se clicou neste artigo.
Sua versão reduzida em 12 etapas se tornou uma espécie de obsessão no Marketing Digital e, muitas vezes, é ensinada como se fosse a única maneira de se contar histórias. Até por isso, existe também um movimento contrário que insiste em apontar o dedo para a Jornada do Herói e dizer que ela não funciona.
Enquanto isso, é bem raro acompanharmos uma discussão sobre a origem da estrutura que, hoje, se popularizou como a Jornada do Herói.
E essa história é uma das melhores formas de responder se ela funciona de verdade, ou não, e como faz sentido aplicá-la.
De bônus, você ainda vai conhecer um exemplo prático de construção de marca pessoal usando o Marketing de Conteúdo.
A busca pelas regras não escritas sobre como escrever um bom roteiro
Conheça Christopher Vogler.
Após trabalhar alguns anos na FOX, em 1992, Vogler era Analista de Histórias na Disney e trabalhava no setor de live action sem grandes destaques, mas estava prestes a trabalhar num dos maiores filmes da história até então: O Rei Leão.
Cada estúdio em Hollywood tinha um batalhão de pessoas atuando dessa forma — como ele próprio comenta em sua entrevista ao Bulletproof Screenwriting Podcast.
Numa espécie de missão pessoal para facilitar sua própria vida, ele decidiu encontrar algo que funcionasse como um guia para analisar os milhares de roteiros em seu trabalho.
Hoje em dia, são tantas opções de livros sobre storytelling, que chega a ser difícil escolher qual ler primeiro.
Nessa época, porém, não era tão simples encontrar como estruturar uma narrativa a partir do que se deve incluir numa história e o que vale a pena evitar.
Foi exatamente isso que Vogler encontrou quando ele descobriu o livro “O Herói de Mil Faces”, de Joseph Campbell — que teve sua primeira versão publicada em 1949.
Neste livro, Campbell constrói o conceito do monomito a partir de uma extensa análise da mitologia, fábulas e lendas. Nesse estudo, ele identificou uma sequência de etapas que os protagonistas passavam até completar sua jornada e se tornar um herói.
Antes, George Lucas já havia creditado o trabalho de Campbell na construção do roteiro dos três primeiros filmes lançados da saga Star Wars e, claro, isso foi um grande reforço para que Vogler aprofundasse seus estudos no monomito.
Com os milhares de roteiros que tinha contato como Analista de Histórias, Christopher Vogler testou a estrutura de Campbell, originalmente com 17 etapas, que o ajudaram a ter um norte para verificar o que torna uma história interessante e emocionante para o público.
Foi nesse momento que ele enxergou que tinha algo com um potencial gigantesco em suas mãos.
Um viral na época dos compartilhamentos via xerox e fax
Chegou o momento de adaptar de vez os conceitos e a estrutura de Campbell para o universo dos filmes e dos roteiros.
As 17 etapas se tornaram 12 e Christopher Vogler fez questão de escrever sobre elas, em apenas 7 páginas, no formato dos memorandos corporativos bem populares na época, com o nome de Um Guia Prático para o Herói de Mil Faces.
E fez isso de forma intencional, para criar um diferencial para seu próprio nome e incentivar as pessoas a falar sobre a jornada do herói e, consequentemente, sobre ele.
Esse memorando espalhou muito rápido e viralizou numa época em que os compartilhamentos aconteciam apenas via máquinas de xerox e fax.
Então, não demorou muito para que o nome de Vogler ficasse associado ao nome de Campbell, Star Wars e à Jornada do Herói.
Também não demorou para que alguém tentasse assumir os créditos pelo seu trabalho.
O chefe de produção do estúdio, Jeffrey Katzenberg, encontrou uma cópia do memorando e o recomendou em uma reunião de altos executivos. Porém, os créditos foram para um executivo, que removeu a folha de rosto original e enviou o documento em seu nome.
Felizmente, Christopher Vogler ficou sabendo disso bem rápido e fez questão de escrever uma carta para Katzenberg, contestando o que havia acontecido, assumindo os créditos pelo memorando e pedindo para ter uma participação maior no processo de criação das histórias do estúdio.
A resposta foi um convite imediato para que Vogler assumisse um cargo no departamento de animação, que havia sido recentemente reativado e emplacava um sucesso atrás do outro, com filmes como A Pequena Sereia, A Bela e a Fera e Aladdin.
E também havia uma empolgação enorme em torno do próximo projeto da Disney, que seria Pocahontas.
Mas Vogler foi trabalhar no que era visto como o time B, num projeto que, até então, tinha o nome de Rei da Selva.
Ele ainda não sabia tão bem o tamanho da influência de seu memorando, mas encontrou logo de cara um quadro de cortiça oficial da Disney Animation, onde estava fixado o storyboard inteiro para o Rei da Selva — com 12 etapas fixadas como espécies de placas de sinalização.
Suas 12 etapas da Jornada do Herói, que deram origem ao livro “A Jornada do Escritor: Estrutura Mítica para Escritores”.
O resto é história.
Aliás, são histórias. Muitas delas você provavelmente conhece.
E se você me perguntar se a jornada do herói funciona ou não, a resposta estava na capa do artigo o tempo inteiro.