“A pessoa mais poderosa do mundo é o contador de histórias. O contador de histórias define a visão, os valores e a agenda de uma geração inteira que está por vir.”
— Steve Jobs
Diante de citações como essa do Steve Jobs — um contador de histórias exemplar, diga-se de passagem —, o Storytelling se tornou um grande desejo das empresas e empreendedores.
E com razão. Afinal, o que nos leva a comprar novos produtos, bens ou serviços: nossas necessidades ou nossas vontades?
No caso de fatores indispensáveis em nossas vidas, são as necessidades. Para os demais, são os desejos.
Enquanto as compras essenciais são guiadas por um raciocínio prático e objetivo, as aquisições motivadas por nossas vontades são completamente subjetivas e irracionais.
Ao descrever seu produto e seus benefícios, você atrai novos clientes por necessidade, mas ignora completamente os desejos.
Agora, com o Storytelling, conseguimos dialogar com esses desejos. Porque, quando bem contadas e construídas, histórias são impactantes, memoráveis e capazes de inspirar mudanças.
Então, após conhecer todo o potencial de contar histórias no universo corporativo, o próximo passo costuma ser encontrar o método mais rápido de colocar tudo logo em prática.
Na grande maioria das vezes, esse método atende pelo nome de Jornada do Herói e, nesse momento, entram em cena os principais erros que costumamos cometer.
A jornada estática
É inegável que a Jornada do Herói funciona. Basta lembrar de toda a legião de fãs de Star Wars que temos uma prova bem clara disso.
Ela surgiu no livro O Herói de Mil Faces, de Joseph Campbell, em que ele analisa diversas histórias e encontra nelas uma espécie de técnica comum às lendas, mitos e fábulas antigas.
A análise original continha 17 etapas e posteriormente foi adaptada por Christopher Vogler, em sua obra A Jornada do Escritor, quando foi condensada em 12 etapas — que tanto se popularizaram e ficaram conhecidas como Jornada do Herói.
Fonte: interprete.me
Essas 12 etapas, quando bem compreendidas e utilizadas, funcionam como uma excelente referência para a construção do roteiro de uma história. O problema é o que uma análise superficial dela pode causar.
Ao procurar por um atalho na Jornada do Herói, os 12 passos são seguidos como uma receita culinária aprendida às pressas via YouTube.
O storyteller executa tudo enquanto escuta o áudio, sem ao menos se dar o trabalho de ver o vídeo. Os ingredientes recomendados são substituídos pelo que tem na cozinha mesmo e, após levar a mistura ao forno, fica a expectativa de o resultado ser minimamente parecido com a foto mostrada na prévia do vídeo.
O que devia ser uma história se torna um checklist de “coisas que precisam acontecer”.
Os três atos são reduzidos meramente a início, meio e fim.
O arco do personagem principal é completamente ignorado e não há transformação alguma.
Sem essa transformação, temos uma Jornada Estática: um protagonista imutável que chega no último ato exatamente como começou e, portanto, é incapaz de inspirar qualquer mudança por parte do público.
“Seja lá o que você fizer, não deixe sua história ficar estática — os personagens devem mudar. Caso contrário, sua história perderá força e seu público rapidamente perderá o interesse. Como disse Will Rogers: ‘Mesmo se você estiver no caminho certo, você será atropelado se ficar apenas sentado lá’.”
— Matthew Luhn, The Best Story Wins: How to Leverage Hollywood Storytelling in Business and Beyond
O arco do protagonista, resumido em três etapas, deve conter:
- O início da história em um dia comum, nos apresentando a rotina do personagem principal;
- Um incidente incitante lança nosso protagonista em uma jornada que proporciona obstáculos e conflitos, desafiando nosso herói fisicamente, psicologicamente e espiritualmente;
- O retorno do personagem principal ao ponto de partida — agora completamente transformado.
Outra forma de encarar o arco é: o que o protagonista era, o que ele aprende e, por fim, em quem ele se transforma.
A Jornada do Herói fornece o contexto necessário para que tudo isso aconteça, desde que as etapas sejam compreendidas — não apenas replicadas.
Mais importante do que decorar e reproduzir a Jornada do Herói, é entender lógica por trás dela e de suas 12, ou 17, etapas.
E compreendendo disso, chegamos ao próximo erro.
A falácia do super-herói
Primeiro, precisamos diferenciar a aplicação do storytelling na ficção e na realidade.
Se a história não é fictícia, é preciso tomar bastante cuidado com a Jornada do Herói para não romantizá-la a ponto de enfeitar a vida como se fosse um grande épico.
Lembre-se: a Jornada do Herói surgiu da análise de lendas, mitos e fábulas. Ao utilizá-la para não ficção, é crucial enxergá-la apenas como uma sugestão de tópicos para começar a construir o seu roteiro — a menos que você queira criar uma fanfic corporativa.
Porém, acredite: a principal falácia do super-herói não é essa. Mas sim quem costuma ser retratado como herói nas histórias de empresas e empreendedores.
Ou seja, a verdadeira falácia do super-herói no storytelling corporativo é querer posar como protagonista das histórias que você conta.
Um erro grave e extremamente sedutor de se cometer, porque ele infla o ego do autor e pode trazer resultados a curto prazo.
Mas, a longo prazo, não se constrói marcas confiáveis dessa forma. Porque as pessoas vão desconfiar das suas histórias e, assim que isso acontecer, a desconfiança será transferida para a marca e para a empresa.
Então, caso você não esteja disposto a renovar constantemente sua audiência, esqueça essa história de posar como herói.
A menos que você esteja contando como começou na carreira ou como fundou sua empresa, o protagonista das suas narrativas deve sempre ser o seu público — ou melhor ainda, o seu cliente.
Com essa abordagem, deixamos o ego de lado e, em vez de insistirmos em gritar para o mundo o quão bons e altruístas somos, nos colocamos na posição de um aliado na jornada do cliente.
Somente dessa forma, é possível tirar o foco da tentativa de vender algo — seja um produto, serviço ou sua própria imagem — e desenvolver uma conexão com seu público, ao tratar dos seus desafios, conflitos e desejos.
“Eu cometi erros no drama. Achei que um drama era quando os atores choravam, mas a verdade é que é quando o público chora.”
— Frank Capra
Somente nos identificamos com uma narrativa e seu protagonista, quando a sua jornada — estruturada seguindo a Jornada do Herói ou não — é uma metáfora para nossas vidas, ou contém uma trajetória que gostaríamos de seguir.
Em vez de posar como herói, seja vulnerável, honesto e respeite a sua audiência. Conte experiências que lidam com emoções honestas, fugindo da manipulação que o sensacionalismo e a romantização podem trazer.
Assim, você terá uma história impactante, memorável e capaz de inspirar mudanças — despertando a identificação do interlocutor com a narrativa e com a marca por trás dela.
Uma história que não conquista apenas curtidas e visibilidade momentânea, mas a confiança do seu público.