Dimitri Vieira

Tudo em nome dos cliques: até que ponto vale se adequar aos estilos, formatos e padrões?

As dúvidas mais comuns de quem começa a produzir conteúdo costumam se resumir a formato e estilo. E o objetivo é simples: encontrar uma maneira rápida e efetiva de ganhar visibilidade. Mas até que ponto vale se adequar aos formatos e padrões encontrados?
Tudo em nome dos cliques: até que ponto vale se adequar aos estilos, formatos e padrões?

As dúvidas mais comuns de quem começa a escrever ou produzir conteúdo online costumam se resumir a formato e estilo.

Qual é melhor: artigo ou publicação no feed? Qual é o tamanho ideal de um artigo? E por aí vai…

O objetivo costuma ser encontrar o hack perfeito: uma maneira prática, rápida e efetiva de ganhar visibilidade produzindo conteúdo.

Se quiser uma resposta direta para artigos no LinkedIn, pesquisas como a de Paul Shapiro entregam isso para você. Ele analisou mais de três mil artigos para encontrar a anatomia do texto perfeito.

Entre 40 e 49 caracteres para o título, de preferência incluindo a palavra “Como” e em formato de lista. Nada de vídeos e procure incluir 8 imagens para tornar o texto mais visual.

Agora, se todos seguirem essa fórmula, temos o problema inicial que todos vão passar a escrever o mesmo artigo. Já imaginou como seriam as acusações de plágio no feed do LinkedIn se isso acontecesse?

Também não temos garantia que esse formato seria eficiente. E nesse ponto, vale deixar claro que escolhi a “fórmula de Paul Shapiro” apenas como exemplo. Toda vez que nos deparamos com uma “receita infalível”, temos problemas bem similares que se repetem.

Primeiro, vamos falar sobre o perigo de se confiar em médias e, depois, dos efeitos de submeter a sua criatividade a um formato enlatado.

Então, antes de você tomar números como regras e fórmulas prontas como leis para seus próximos conteúdos, deixa eu te contar uma história.

O perigo de se confiar nas médias

Para desenvolver uma aeronave mais rápida, em 1950, parte dos esforços da força aérea norte-americana foram investidos em otimizar o cockpit.

Para esse projeto, foram consideradas mais de 140 dimensões e mais de 4 mil pilotos foram medidos. A ideia era bem simples: a partir da média das características corporais de todos eles, o formato perfeito para a cabine de pilotagem seria encontrado.

Os instrumentos estariam visíveis para a maioria dos pilotos e os controles seriam de fácil alcance, com raras exceções.

O resultado? Nem sequer uma única pessoa, entre as 4 mil, encaixava no cockpit.

Ao tentar criar a cabine perfeita para o “piloto médio”, a força aérea dos EUA acabou criando algo em que ninguém se encaixava.

Essa história é contada no excelente livro Alchemy: The Dark Art and Curious Science of Creating Magic in Brands, Business, and Life, de Rory Sutherland.


“Métricas, especialmente médias, incentivam você a focar em um público e mercado intermediários, mas a inovação acontece nos extremos. É mais provável que você tenha uma boa ideia focando em um ponto fora da curva do que em dez usuários comuns.”

— Rory Sutherland


É aquele velho ditado que você já cansou de ouvir: “quem busca agradar a todos, agrada a ninguém”. Na escrita, é bem parecido: se você escreve para todos, você escreve para ninguém.

Agora, vamos ver o que acontece com a criatividade e, principalmente, com a mensagem transmitida pelo conteúdo — ou talvez, a mensagem que deixa de ser transmitida.

Os efeitos da criatividade enlatada em um formato

Um fenômeno que representa bem esses efeitos é o que costuma acontecer com cantores de hardcore e punk.

Vários artistas desse gênero crescem, conquistam uma base leal de fãs e, então, decidem apostar em um projeto acústico. Se você é fã desse estilo, certamente conhece um cantor que decidiu pegar um violão e apostar em um formato mais intimista.

As letras, que antes ficavam em segundo plano, são trazidas para os holofotes e, muitas vezes, é somente nessa etapa da carreira que o cantor finalmente se encontra.

Foi o que aconteceu com Brian Fallon, vocalista e autor da maioria das músicas da banda norte-americana The Gaslight Anthem.

Após uma carreira de 13 anos na música, Brian Fallon afirmou no mês passado que, hoje, ele finalmente se sente realizado com seu trabalho e suas composições.

E tem uma música que traduz perfeitamente o que ele quis dizer.

1930 é uma das faixas do álbum de estreia da banda — Sink or Swim, lançado em 2007. Esse disco capta a essência do que Brian conhecia e se sentia confortável na música. Todas as faixas são bem rápidas e pesadas, com apenas duas canções de descanso.

Uma das mais tocadas em shows é justamente 1930, que tem uma frase bem curiosa em seu trecho final:

Se me lembro bem, a última coisa que você me disse

Antes de tudo terminar, você disse: “Eu te amo mais do que as estrelas no céu

Mas seu nome me escapa hoje à noite.

Em cada show da banda, a frase destacada em negrito é repetida várias vezes, enquanto o público se digladia em rodas punk.

(Se quiser assisti-la na íntegra, clique aqui. Para conferir apenas o trecho final, aqui.)

Na letra, ele sempre se dirige à Mary e logo presumi que se tratava de uma ex-namorada ou um relacionamento mal resolvido. Mais um término que inspirou uma música, certo? Nada fora do padrão, já vimos isso antes e não foram poucas vezes.

Acontece que o hardcore foi onde Brian se encontrou e essa mesma identificação foi o que acabou limitando-o.

Por mais que o ritmo acelerado e os gritos abafassem o que ele tinha para dizer, esse estilo era o que ele conhecia. Era a forma que ele permitia se expressar — literalmente gritando para se encaixar.

Quando vamos pelo caminho mais fácil e prático na produção de conteúdo, fazemos algo parecido. Com a diferença de que não estamos no palco, mas no meio do público e quem está em destaque é o formato (ou o assunto) do momento.

Disputamos com toda a audiência, na base do grito, por um mero lampejo durante o bombardeio de informações. E mesmo que esse destaque venha, ele tem um preço alto: nossa autenticidade.

De tanto polir nossas ideias para encaixá-las no formato, elas assumem uma cara tão genérica, mas tão genérica, que mal dá para reconhecê-las.

Quer um exemplo?

Mary não é o nome de uma ex-namorada de Brian Fallon, nem foi um relacionamento mal resolvido. 1930 não é uma música sobre término, é uma despedida.

Uma carta de despedida de Brian para sua avó, que havia acabado de falecer.

Se me lembro bem, a última coisa que você me disse

Antes de tudo terminar, você disse: “Eu te amo mais do que as estrelas no céu

Mas seu nome me escapa hoje à noite.

Na sua nova fase de carreira, longe da banda e acompanhado apenas do violão — às vezes do teclado —, a voz de Brian ecoa de uma forma que jamais seria possível no formato que antes era o seu padrão.

Ele até toca para públicos menores, mas o que ele tem para dizer nunca foi tão claro.

E se não há nada mais amargo do que assistir alguém tentar ser algo que não é — como o próprio Brian disse —, uma das coisas mais bonitas é testemunhar o trabalho de alguém na sua essência.

Felizmente, a música ganhou uma nova versão e é a representação perfeita disso. Basta apertar o play para notar o quanto ela transborda sentimento e que não, não pode se tratar de apenas mais uma canção inspirada por um término.

Para quem escreve com o objetivo de transmitir uma mensagem — e não o de contabilizar números para se vangloriar —, não adianta procurar pelo formato perfeito. É a mensagem que escolhe o formato.

A cantora Nina Simone que o diga:


“O que espero fazer o tempo todo é ser tão completamente eu mesma, que meu público, as pessoas que me conhecem, sejam confrontadas. Que elas sejam confrontadas com o que eu sou, por dentro e por fora, da maneira mais honesta possível. E assim, elas precisem ver as coisas sobre si mesmas imediatamente.”

— Nina Simone


Na escrita, existem boas práticas, mas não há regras escritas em pedra e, mesmo assim, às vezes insistimos em procurar por elas.

Então, nos lembramos novamente que não tem fórmula pronta.

Não tem hack.

Não tem formato que nos ensine a alcançar o nível de autenticidade à que Nina Simone se refere.

Dimitri Vieira

Sou um escritor e produtor de conteúdo, especializado em Escrita Criativa, Storytelling e LinkedIn para Marcas Pessoais. Minhas maiores paixões sempre foram a música, o cinema e a literatura. Escrevendo textos na internet, consegui unir o melhor desses três universos, e o que era um hobby acabou me transformando em LinkedIn Top Voice e, hoje, se tornou minha profissão.

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