Dimitri Vieira

A coragem de desistir e a arte de fechar portas

É tanto discurso motivacional de “vá em frente” e “não desista” que, às vezes, pode parecer que desistir, encerrar ciclos e fechar portas não são opções.

O detalhe é que entender a hora certa de deixar de insistir em algo pode ser tão importante quanto a coragem de assumir riscos e começar algo inédito.

Se você passou por alguma mudança drástica para começar algo novo e precisou deixar algo para trás, aposto que sabe como funciona.

Boa parte das pessoas ignora o novo e te pergunta: então você vai desistir do velho?

Escutei isso pela primeira vez quando me formei em engenharia e comecei a trabalhar com marketing. Ouvi de novo quando estava bem na Rock Content e decidi apostar todas as minhas fichas na minha marca pessoal.

E voltei a ouvir quando anunciei que deixaria a agência de influência que fundei e, tenho certeza, vou ouvir mais vezes.

Faz parte do jogo e, por mais que boa parte dessas pessoas talvez não enxergue fechar portas como opção, também entendo que elas acabam se apegando ao velho conhecido.

Mas tão problemático quanto desistir de primeira é não desistir nunca.

As pessoas vão sempre te perguntar “quando foi a última vez que você fez algo pela primeira vez?”, mas quando você fez algo que já não te fazia bem pela última vez?

Saber a hora certa de sair pela porta da frente é preservar o que houve de bom. É bater a porta, trancar e manter a chave no chaveiro por apego emocional.

Acredito que foi em How I Met Your Mother, após o término de um casal, que disseram que não era um relacionamento que deu errado. Mas um relacionamento que deu muito certo por um tempo limitado.

Talvez, algum dia, você até arrisque voltar pela nostalgia. Talvez não.

Quem sabe você encontra as portas abertas.

Ou não. Talvez, você descubra que as fechaduras foram trocadas logo após sua saída — e a única utilidade da chave é mesmo o apego emocional, mas um apego emocional a uma porta que você não pode mais abrir.

E você finalmente entende que aquela chave era justamente o que te fazia não abrir novas portas.

Leve e inofensiva, parecia não ocupar espaço algum, mas basta tirá-la e novas portas se abrem com mais facilidade. Porque você só começa algo novo de verdade quando se desprende de algo velho.

Para entrarmos de vez na contramão do discurso motivacional do “não desista”, acredito que tem boas chances de você conhecer o ator Tom Hardy. Mas talvez não conheça o filme Bronson, onde ele interpreta um dos mais perigosos e excêntricos criminosos de todos os tempos.

Enquanto se preparava para o papel, Tom Hardy conversou bastante com Bronson para entender como interpretar o criminoso nos mínimos detalhes. Numa dessas conversas, o ator havia acabado de terminar um relacionamento e decidiu confessar como se sentia.

— Não estou confortável, estou me despedindo de alguém que realmente amei. Não estou feliz, não estou bem. Não consigo ficar com uma mulher e, no entanto, não consigo ficar sem uma…

A resposta de Bronson ajuda a justificar o porquê do fascínio de se fazer um filme sobre um criminoso como ele:

— Você se lembra das inundações que aconteceram em Oxford? Lembra daquele garoto que ficou com o pé preso na grade, e o rio continuava subindo, e continuava subindo, e continuava subindo, e eventualmente tentaram tirá-lo, mas ele se afogou?

O ator confirmou que se lembrava e ele continuou:

— Bem, isso não teria acontecido comigo. Quer saber por quê?

Tom disse que sim e ele concluiu:

— Porque eu teria dito: corta fora agora.

Depois amarrou sua ideia para explicar que, às vezes, você tem que cortar um pedaço de si mesmo, não importa o quanto doa, para poder crescer.

Para poder seguir em frente.

A coragem de não desistir pode encher seu chaveiro de chaves que não abrem mais portas e pode fazer a água subir mais do que deveria.

Às vezes, o “vá em frente” — o Keep Going — fica melhor mesmo como slogan de whisky e a coragem de verdade está em fechar a porta, atirar a chave fora e abrir espaço para seguir em frente.

Dimitri Vieira

Sou um escritor e produtor de conteúdo, especializado em Escrita Criativa, Storytelling e LinkedIn para Marcas Pessoais. Minhas maiores paixões sempre foram a música, o cinema e a literatura. Escrevendo textos na internet, consegui unir o melhor desses três universos, e o que era um hobby acabou me transformando em LinkedIn Top Voice e, hoje, se tornou minha profissão.

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